Algumas vezes as pessoas líderes são cobradas por determinadas respostas que não possuem. Em alguns casos se trata de falta de contexto ou velocidade de decisão, o que deve ser corrigido. Em outras situações se trata de algo normal. Há um caso onde as respostas simplesmente não existem de antemão, mas passam a existir quando se necessita delas. Entender isso pode tornar sua vida mais fácil.
Esse é quinto texto da série sobre decisões e processos decisórios. Se tiver interesse numa pequena introdução à série, sugiro ler Decisões, um bônus da liderança? . Ainda como contexto, em outro texto apresento um processo decisório que chamo de Arena de Decisão, e que foi o motivo de eu ter criado esse termo que apresento, as Respostas de Schrödinger. Comentarei um pouco sobre esse tipo de respostas, e a apresentarei alguns aprendizados específicos sobre modelos de decisão colaborativos. Ao fim, como curiosidade, vou falar um pouco de física quântica pra explicar onde me inspirei para esse apelido, Schrödinger.
As Decisões e Respostas de Schrödinger e alguns aprendizados
Conforme comentei em Decisões, um bônus da liderança? , cabe à liderança garantir e trabalhar para que decisões sejam tomadas, mas as vezes são possíveis estruturas que permitam decisões mais colaborativas e descentralizadas, e nesse caso caberia à liderança a criação de tais estruturas. Um dos processos possíveis decisórios colaborativos seria o modelo de Arenas de Decisão.
Uma coisa que aprendi ao trabalhar com esse modelo ou outros similares é que existem decisões cuja resposta, ou fórmula para se chegar nela de maneira direta, não existe até que se olhe para elas. Eu chamo decisões com essas características de Decisões de Schrödinger. Ou, pensando de outra perspectiva, chamo as respostas para essas decisões de Respostas de Schrödinger:
Respostas que não existem até que se tornem necessárias, até que olhemos para elas. Além disso há certo indeterminismo envolvido, certa complexidade no sentido de não haver uma fórmula linear de causa-efeito. Não há uma regra que permita calcular seus resultados de maneira direta. Porém elas serão descobertas e aplicadas quando necessárias.
Um exemplo extremo: Qual será o resultado das próximas eleições para vereador ou vereadora em sua cidade? É uma resposta que influencia toda a população, e cujo resultado virá da própria população em uma arena de decisão democrática. Porém está claro pra todos que, exceto estimativas imprecisas, não se pode saber a resposta de antemão. Nem por isso o processo democrático é falho. De certa forma, em minha definição, esse seria um exemplo uma Resposta de Schrödinger. Exemplos mais empresariais existem ali no texto sobre Arenas de Decisão.
Respostas de Schrödinger aparecem com frequência em processos decisórios nos quais não há regras ou fórmulas rígidas, não há muita burocracia, e onde há alto nível de autonomia dentre pessoas envolvidas. Em especial, mas não somente, elas aparecem em processos decisórios colaborativos. Embora no exemplo da eleição seja fácil identificá-las por ser um exemplo extremo, em uma empresa nem sempre. Ao menos pra mim foi um processo até interiorizar isso e estar ok com isso.
Houveram outros aprendizados ao vivenciar modelos colaborativos de tomada de decisão em empresas. Cito os principais abaixo:
- Nem sempre as respostas em decisões aparentemente similares serão as mesmas em situações distintas. Depende de quem participou da decisão, de qual o processo decisório escolhido, dos interesses dessas pessoas naquele momento, do estado da empresa e de seu entorno, das restrições de negócio ou de mercado em voga na ocasião.
- Algumas perguntas hipotéticas, em especial aquelas que começam com “e se…“, deixam de ter sentido, justamente porque a resposta não existe até que se torne necessária. Por exemplo “E se tal situação tivesse ocorrido, qual teria sido a decisão?“, isso não se aplica mais, não importa.
- É necessário confiar no grupo. Para tanto, é necessário transparência, contexto, competência e visão clara dos objetivos e propósitos.
- Deve-se garantir que há ao menos um ponto comum entre todos os participantes, uma visão compartilhada por todos – em última instância, todos concordam que a continuidade da existência da organização é importante. Apenas com isso os múltiplos interesses tendem a convergir para soluções onde a organização prospera.
- Nem sempre poderemos comprovar se a decisão foi a melhor possível. Mas em um ambiente com grande multiplicidade de variáveis e peças móveis é praticamente impossível ter tal certeza em tempo hábil de qualquer maneira.
- Ao mesmo tempo em que não se pode comprovar que a decisão foi a melhor, pode-se verificar se, no geral e no decorrer do tempo, caminhamos em direção aos objetivos ou nos afastando deles. Uma vez que esse aprendizado seja organizacional (de todo o grupo), ele realimenta as próximas decisões.
- Decisões colaborativas respeitam a inteligência, o profissionalismo e a autonomia das pessoas (que quase sempre sabem mais que eu!), e tendem a aumentar o nível de engajamento.

E o principal:
Com o tempo aprendi que tudo isso acima é ok, que está tudo bem. Parece trivial agora, mas foi libertador internalizar esse entendimento. Aceitar as Respostas de Schrödinger me liberta de achar que sempre preciso saber qualquer resposta, que sempre tenho que saber exatamente como e quando a resposta será obtida.
Conhecer tais modelos também ajudam na comunicação com as pessoas, pois nos provê algum vocabulário e sistemas para comunicar melhor alguns casos tentando manter a sensação de segurança e de que sim, as coisas estão sob controle. Por fim, entender também onde alguns modelos, como os colaborativos, não se encaixam e quais opções existem, me permite selecionar outros processos decisórios que fazem mais sentido em outros casos.
Agora, um pouco de física quântica

Esse trecho não é necessário para o ponto principal desse texto. É, na verdade, uma curiosidade quanto a de onde veio o nome que eu dou a essas respostas. Se não tem curiosidade sobre de onde veio esse nome, ou se não gosta de física quântica, sinta-se a vontade de pular esse trecho e ir direto para o próximo artigo da série.
Acho interessante também verificar que esse tipo de incerteza ou complexidade existe em diversos níveis, inclusive em um dos níveis mais básicos da matéria que compõe nosso universo e existência física.
Entendo pouco sobre o assunto, mas acho legal a tal física quântica. Ela explica o comportamento do universo de maneira lógica, racional e mensurável. Porém foge um pouco ao senso comum e à nossa maneira habitual de pensar nas coisas… Temos que quebrar alguns paradigmas entrarmos de mente aberta ao estudá-la.
Nessa disciplina há um princípio chamado de Princípio da Incerteza de Heinsenberg (o mesmo Heinsenberg que dá nome ao personagem do Breaking Bad). Esse princípio declara ser impossível determinar simultaneamente a velocidade e a posição de um elétron. Mais que isso, Heinsenberg propõe que o próprio ato de medir ou observar o comportamento de um elétron influencia esse comportamento. Isso é: quando olho para o elétron, eu consigo saber onde ele está e essa posição que vejo é influenciada pelo fato de eu estar olhando. Mas se paro de olhar, não é mais possível saber onde ele está, independente de qualquer modelagem, previsão ou fórmula. Parece bem distinto do que vemos no mundo observável de nosso dia-a-dia, não é? Se deixo de olhar pra minha carteira, ainda assim sei que ela ainda está ali, que ela ainda existe (ou assim espero!!!).

Com base no Princípio da Incerteza, outro físico, chamado Schrödinger, propôs um experimento mental. Experimento puramente teórico (não façam em casa, por favor!) onde ele propõe uma maneira de pensar o princípio da incerteza com algo observável em nosso dia-a-dia, no caso um gato. Não vou detalhar o experimento que envolve caixas adaptadas, radioatividade, venenos e um gato; mas em linhas gerais o experimento mental do Gato de Schrödinger monta uma situação hipotética onde um gato estaria preso em uma caixa e seria impossível saber se ele está vivo ou morto até que se abra a caixa. E o próprio ato de abrir a caixa influencia nesse resultado. É daí que vem o nome apresentado nesse artigo.
Para finalizar, volto um pouco às Respostas De Schrödinger, agora sob a ótica dessa analogia com a física quântica. Como comentei acima, há decisões cuja resposta, ou fórmula para se chegar nela de maneira direta, não existe até que se olhe para elas. Justamente como a posição do elétron na física quântica. Ou como saber se o gato está vivo ou morto. Algumas vezes, assim como na física, o próprio fato de buscar essas respostas irá influenciar nas mesmas. E é natural.
Também falei das perguntas hipotéticas que começam com “e se…” deixarem fazer sentido porque a resposta ainda não existe nem é determinável. Por exemplo “E se tal situação tivesse ocorrido, qual teria sido a decisão?“: O gato está na caixa, não se sabe se está vivo ou morto, e nem há como saber.
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Referências: